Avançar para o conteúdo principal

Whey Protein Adulterada – O Lado Obscuro dos Suplementos Proteicos

A proteína whey é um dos suplementos mais usados pelos praticantes de musculação. Um estudo recente, realizado em São Paulo, verificou que 84% destes atletas suplementa-se com whey(1) e espera-se que o mercado dos suplementos continue a crescer ao longo dos próximos anos.(2, 3)

Estes suplementos de proteína são procurados devido à sua elevada qualidade nutricional, absorção rápida e por serem uma fonte rica de aminácidos essenciais, sobretudo de aminoácidos ramificados (leucina, isoleucina e valina).(4)

Mas será que os consumidores estão a adquirir produtos de qualidade, que contêm os ingredientes e as respetivas quantidades declaradas nos rótulos?

Teor de proteína abaixo do declarado

Em 2014, a PROTESTE – Associação Brasileira de Defesa do Consumidor, testou 20 marcas de suplementos de whey protein e verificou que apenas 6 continham o valor correto de proteína. 5 marcas continham menos proteína e 13 tinham mais carboidratos do que os valores declarados no rótulo.(5)

No mesmo ano, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) avaliou 25 marcas de suplementos de proteína e verificou que 19 tinham um teor de carboidratos superior ao limite legal, tendo determinado a proibição da distribuição e da comercialização de 20 marcas.(6)

Os resultados revelaram ainda a presença de ingredientes baratos, não declarados no rótulo, incluindo soja, milho, mandioca e amido, que parecem ter sido usados para adulterar estes suplementos.(6)

Um ano mais tarde, um grupo de investigadores analisou o teor total de proteína de 20 dos suplementos de whey protein mais vendidos numa loja online especializada em suplementos nutricionais. (7)

  • 10 desses suplementos eram produzidos por empresas dos EUA e outros 10 eram produzidos por empresas do Brasil.
  • Das 10 marcas de suplementos de whey de marcas dos EUA, 4 tinham um teor de proteína inferior ao descrito na informação nutricional do rótulo.
  • Dos 10 suplementos de marcas brasileiras, 7 não continham a quantidade de proteína especificada no rótulo.

No seu estudo, os investigadores referiram ainda que:

Nenhum dos suplementos de whey protein avaliados neste estudo atingiram o valor total de proteína descrito na literatura (até 80% para a whey concentrada e mais de 90% para a whey isolada.)

De uma forma geral, verifica-se que os suplementos de whey protein de marcas dos EUA têm um teor de proteína total mais elevado do que aqueles produzidos por empresas brasileiras, o que parece oferecer suporte à preferência dos brasileiros por suplementos “importados”.(7)

O site Labdoor, uma empresa independente que efetua análises de qualidade a suplementos alimentares vendidos nos EUA, verificou que, de 81 suplementos de proteína testados, 16 tinham um teor de proteína 15% inferior ao mencionado no rótulo. Dessas 16 marcas, 5 tinham menos 40% de proteína do que o valor declarado.(8)

Para além disso, 28% dos suplementos de proteína avaliados pela Consumer Lab, outra empresa privada especializada na avaliação da qualidade de alimentos e suplementos vendidos nos EUA, falharam os seus testes de avaliação de qualidade, sendo frequente a deteção de valores de proteína inferiores aos indicados nos respetivos rótulos.(9)

Adulteração com proteínas mais baratas

Os investigadores de um estudo recente afirmam que o whey protein, devido à sua popularidade, tem sido objeto de adulteração com produtos substitutos, incluindo proteínas mais baratas e com valor biológico mais baixo.(3)

No seu estudo, eles analisaram 16 suplementos de proteína e verificaram que 6 marcas tinham concentrações elevadas de outras fontes de proteína para além de proteínas de origem bovina, principalmente proteína de soja, trigo e arroz.(3)

Estes investigadores escreveram:

Esses resultados apontam para uma provável adulteração e/ou contaminação desses suplementos durante o processo de produção.(3)

Amino Spiking

Outro método possível de adulteração de suplementos de whey protein é a adição de compostos que contêm nitrogénio, incluindo creatina e também de aminoácidos livres como a glicina, taurina e glutamina, devido a estes serem mais baratos do que o concentrado de whey protein.(10)

Isto poderá ser mais difícil de detetar pelos métodos habitualmente usados, incluindo o método de Kjeldahl porque, em geral, esses métodos pesquisam compostos nitrogenados e não pesquisam especificamente por aminoácidos.(3)

O problema aqui é que esses outros compostos nitrogenados não têm as mesmas propriedades nutricionais que as proteínas de alto valor biológico que se esperam estar presentes no whey protein.(3)

Segundo o site Labdoor, de 81 suplementos de proteína testados, 38 continham quantidades detetáveis e elevadas de aminoácidos em forma livre, os quais aumentam o teor de proteína nos testes de laboratório habituais.

A asparagina foi o aminoácido mais detetado, seguido pela alanina, glicina, taurina e leucina, tendo também sido detetados os aminoácidos histidina, glutamina, alanina e cisteína.(8)

Entretanto nos EUA, foram aplicadas várias ações judiciais coletivas contra marcas de whey protein por estas aplicarem o Amino Spiking para aumentar as suas margens de lucro.(10)

Onde encontrar whey protein de qualidade?

A melhor opção provavelmente será pesquisar suplementos que tenham sido analisados por entidades independentes, tais como a Consumer Lab, Labdoor e a Proteste ou por entidades governamentais como a ANVISA.

Segundo a avaliação efetuada pela PROTESTE em 2014(5), os suplementos de whey que efetivamente continham as quantidades declaradas de proteína foram:

  • 100% Whey Gold Standard (Optimun Nutrition)
  • Whey 3W (Max Titanium)
  • 100% Pure Whey (Probiótica)
  • Isofusion (Gaspari Nutrition)
  • Whey Protein Isolate (Now Sports)
  • 100% Whey Fuel (Twinlab).

E segundo as análises efetuadas pela ANVISA no mesmo ano(6), foram:

  • 100% Pure Whey (Probiótica Laboratórios)
  • 100% Whey Protein (Neo Nutri Suplementos Nutricionais)
  • 3 Whey Proto NO² (Neo Nutri Suplementos Nutricionais)

Conclusão

Os suplementos de whey protein são relativamente dispendiosos e os consumidores esperam que estes produtos efetivamente contenham os ingredientes e devidas quantidades listadas no rótulo.

Lamentavelmente, isso nem sempre acontece e parece ser necessário um maior controlo da qualidade dos suplementos alimentares por parte da indústria dos suplementos e das autoridades responsáveis, de forma a assegurar que o conteúdo corresponde à quantidade declarada no rótulo, bem como garantir a  segurança alimentar dos ingredientes presentes.(11)

➤ Mostrar/Ocultar Referências!

  1. Andréa Regina Pellegrini FSN, Marina Rodrigues Barbosa. Consumo de suplementos nutricionais por praticantes de musculação da cidade de São Carlos-SP. Revista Brasileira de Nutrição Esportiva. 2017
  2. Sports Nutrition in Brazil. https://www.euromonitor.com: Euromonitor International; 2017. Disponível em: https://www.euromonitor.com/sports-nutrition-in-brazil/report.
  3. Garrido BC, Souza G, Lourenco DC, Fasciotti M. Proteomics in quality control: Whey protein-based supplements. Journal of proteomics. 2016; 147:48-55.
  4. Haraguchi FK, Abreu WCd, Paula Hd. Proteínas do soro do leite: composição, propriedades nutricionais, aplicações no esporte e benefícios para a saúde humana. Revista de Nutrição. 2006; 19:479-88.
  5. PROTESTE encontra irregularidades em suplementos para atletas. https://www.proteste.org.br: PROTESTE; 2014. Disponível em: https://www.proteste.org.br/institucional/imprensa/press-release/2014/proteste-encontra-irregularidades-em-suplementos-para-atletas.
  6. Proibição – Vinte lotes de suplementos para atletas são retirados do mercado. http://www.brasil.gov.br: Governo do Brasil; 2014. [atualizado em: 2017]. Disponível em: http://www.brasil.gov.br/editoria/saude/2014/02/anvisa-proibe-20-lotes-de-suplementos-para-atletas.
  7. Almeida CC, Alvares TS, Costa MP, Conte-Junior CA. Protein and Amino Acid Profiles of Different Whey Protein Supplements. Journal of dietary supplements. 2016; 13(3):313-23.
  8. Top 10 Protein Supplements. https://labdoor.com: Labdoor; 2018. Disponível em: https://labdoor.com/rankings/protein.
  9. Product Reviews – Protein Powders, Shakes, and Drinks Review. https://www.consumerlab.com: ConsumerlLab; 2018. Disponível em: https://www.consumerlab.com/reviews/Protein_Powders_Shakes_Drinks_Sports/NutritionDrinks/.
  10. Amino Acid Spiking Scam: Is Your Protein Really PROTEIN? : Price Plow -Suplement Deals, Reviews, and News Blog; 2014. Disponível em: https://blog.priceplow.com/protein-scam-amino-acid-spiking.
  11. Kreider RB, Wilborn CD, Taylor L, Campbell B, Almada AL, Collins R, et al. ISSN exercise & sport nutrition review: research & recommendations. Journal of the International Society of Sports Nutrition. 2010; 7:7-7.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Quanta proteína é possível absorver por refeição?

Dentre a série de tópicos relativamente controversos englobados no mundo da nutrição temos a questão da quantidade de proteína que o corpo humano consegue absorver no seguimento de uma dada refeição. Relacionado com a mesma temática, temos a questão da definição da quantidade de proteína que idealmente se deve ingerir após a execução de um treino resistido, com vista a maximizar a síntese de proteína muscular. Estudos publicados até há poucos anos concluíram que a ingestão de 20 a 25 g de proteína de boa qualidade (whey, proteína do leite, ou proteína de ovo) após um treino de musculação direcionado à musculatura dos membros inferiores seria o suficiente para maximizar a síntese de proteína muscular em adultos jovens e saudáveis, sendo que em doses superiores os aminoácidos “excedentários” seriam simplesmente oxidados. 1,2   Entretanto, em 2016, os autores Macnaughton et al. 3 verificaram que a suplementação com 40 g de proteína whey após uma sessão de treino de musculação de corpo i

Os Suplementos Termogénicos Funcionam?

A obesidade encontra-se classificada como uma doença crónica cuja prevalência tem vindo a aumentar ao ponto de atualmente ser considerada uma pandemia. ¹ Atualmente, verifica-se que a maioria da população europeia (60%) encontra-se na categoria de pré-obesidade, ou obesidade. ¹ Em Portugal o cenário é relativamente similar, com 57,1% dos indivíduos a apresentar um índice de massa corporal ≥25 kg/m². ²   Logicamente, esta população numerosa representa um mercado apetecível para as empresas envolvidas na produção e/ou comercialização de suplementos alimentares, que ambicionem aumentar as suas vendas.  Do conjunto de suplementos direcionados para a perda de peso/gordura, destacam-se os termogénicos, os quais, supostamente, promovem um aumento da lipólise através de um aumento do metabolismo, induzido por determinados compostos presentes nesses suplementos.  Mas será que os suplementos termogénicos efetivamente facilitam a perda de peso ou de gordura em indivíduos pré-obesos ou obesos?  Cl

É Melhor Perder Peso de Forma Rápida ou Lenta?

A perda de gordura pode proporcionar vários benefícios para a saúde daqueles que têm excesso de peso. ¹⁻² e é uma necessidade imperativa para atletas de determinados desportos e para aqueles que participam em competições de culturismo e similares.³ No entanto, independentemente do ritmo a que se perde peso, há uma série de consequências negativas que são praticamente impossíveis de evitar. Esses efeitos indesejáveis incluem a diminuição da taxa metabólica basal em repouso,⁴ dos níveis de testosterona,⁵ perda de massa magra,⁶ e diminuição da força muscular.⁷⁻⁸ De forma a minimizar esses efeitos negativos, são muitos aqueles que evitam as dietas mais drásticas, do tipo yo-yo e que, em vez disso, aconselham uma perda de peso lenta, por exemplo, de 0,5 kg de peso corporal, por semana.³ O que diz a ciência? Já foram conduzidos variados estudos que procuraram determinar qual a velocidade de perda de peso que melhor preserva a taxa metabólica, a massa magra, bem como os níveis de testosterona