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É Melhor Perder Peso de Forma Rápida ou Lenta?

A perda de gordura pode proporcionar vários benefícios para a saúde daqueles que têm excesso de peso. ¹⁻² e é uma necessidade imperativa para atletas de determinados desportos e para aqueles que participam em competições de culturismo e similares.³

No entanto, independentemente do ritmo a que se perde peso, há uma série de consequências negativas que são praticamente impossíveis de evitar. Esses efeitos indesejáveis incluem a diminuição da taxa metabólica basal em repouso,⁴ dos níveis de testosterona,⁵ perda de massa magra,⁶ e diminuição da força muscular.⁷⁻⁸

De forma a minimizar esses efeitos negativos, são muitos aqueles que evitam as dietas mais drásticas, do tipo yo-yo e que, em vez disso, aconselham uma perda de peso lenta, por exemplo, de 0,5 kg de peso corporal, por semana.³

O que diz a ciência?

Já foram conduzidos variados estudos que procuraram determinar qual a velocidade de perda de peso que melhor preserva a taxa metabólica, a massa magra, bem como os níveis de testosterona e outras hormonas.

Indivíduos Obesos

Em 2019, Ashtary-Larky et al.⁹ conduziram uma revisão sistemática e meta-análise da literatura, com o propósito de comparar os efeitos entre uma velocidade de perda de peso gradual e uma velocidade rápida, na composição corporal e na taxa metabólica de repouso.

Para esse efeito, apenas incluíram estudos que aplicaram regimes de restrição energética durante um período superior a 2 semanas, e que aplicaram ambos protocolos de velocidade de perda de peso (gradual e rápida)

  • Os 7 estudos adicionados a esta revisão incluíram apenas voluntários com excesso de peso ou obesidade (IMC > 25 kg/m²), e com uma idade igual ou superior a 18 anos.
  • Do número total de estudos, 5 incluíram voluntários de ambos os sexos, e 3 incluíram apenas mulheres.
  • O período das intervenções variou entre 9 a 36 semanas nos grupos que adotaram regimes de perda de peso gradual, e entre 5 a 12 nos grupos que seguiram regimes de perda rápida.

Resultados:

A tabela abaixo apresenta as mudanças médias registadas na perda de peso rápida e gradual, no peso, IMC, massa magra, massa gorda, % de gordura, circunferência da cintura, circunferência da anca, e ainda na taxa metabólica basal.

 

Perda Gradual

Perda Rápida

Peso (kg)

-7,5 (± 3,5)

-7,7 (± 3,5)

IMC (kg/m²)

-3 (± 1,5)

-3 (± 1,6)

Massa Magra (kg)

-0,6 (± 0,6)

-1,6 (± 1,3)

Massa Gorda (kg)

-6,7 (± 3,7)

-5,6 (± 3,6)

% de Gordura Corporal

-3,8 (± 1,2)

-2,5 (± 1,8)

Circunferência da cintura (cm)

-8,7 (± 4,2)

-7,8 (± 4,5)

Circunferência da anca (cm)

-7,4 (± 5)

-6,3 (± 4,7)

Taxa Metabólica Basal (kJ)

-87,5 (± 74,3)

-136,9 (± 58,6)

Visualizando a tabela acima, e apesar do cenário geral favorecer a perda de gordura gradual, registando-se inclusive uma menor perda de massa magra e maiores perdas ao nível das circunferências, as diferenças apenas atingiram significado estatístico para as variáveis “massa gorda” e “percentagem de gordura corporal”, cujos valores diminuíram de forma mais expressiva na perda de peso gradual.

Os autores deste trabalho concluíram:

“A perda de peso gradual associa-se a uma maior perda de massa gorda e diminuição da percentagem de gordura corporal, bem como uma maior manutenção da taxa metabólica basal em indivíduos com excesso de peso e obesidade.”

“No entanto, a taxa de perda de peso não foi associada a diferenças significativas na massa magra, na circunferência da cintura e na circunferência da anca.”

Praticantes de Exercício Resistido e Atletas de Elite

Os praticantes de exercício resistido e os atletas de elite, que tipicamente apresentam percentagens de gordura relativamente baixas, representam uma população distinta da dos indivíduos com excesso de peso/obesidade e tipicamente sedentários.³

Infelizmente ainda não foi publicada, para esta população em específico, uma meta-análise que tenha avaliado os efeitos de uma perda de peso lenta versus perda rápida. Por esse motivo, passarei a descrever alguns estudos individuais.

Mero et al. (2010) 

Neste estudo⁸ participaram 15 mulheres que habitualmente realizavam exercício resistido e exercício aeróbico e que tinham um peso considerado normal. Aqui, as 15 voluntárias foram separadas em dois grupos:

  • Um grupo seguiu uma dieta com um défice calórico de 1100 kcal/dia, com vista a perder 1 kg de peso por semana.
  • O outro grupo seguiu uma dieta com um défice de 550 kcal/dia, de forma a perder 0,5 kg por semana.

Ao longo desta experiência, que durou 4 semanas, ambos dois grupos seguiram uma dieta rica em proteína, tendo ingerido pelo menos 1.4 gramas por kg de peso corporal, por dia.

Os investigadores verificaram que nenhum grupo perdeu massa magra e que ambos reduziram de forma significativa a sua percentagem de gordura corporal, sendo que essa redução foi mais acentuada no grupo que seguiu a dieta mais rigorosa.

No entanto, o grupo que seguiu a dieta para perder 1 kg por semana sofreu uma redução mais significativa dos níveis de testosterona (de 1,8 ± 1,0 para 1,4 ± 0,9 nmol/l) do que o grupo do 0,5 kg. Essas mulheres também perderam força (1RM) no exercício supino (de 36,3 ± 7,1 para 34,7 ± 6,3 kg), enquanto o grupo do 0,5 kg manteve.

Garthe et al. (2011)

Garthe e colegas¹⁰ compararam os efeitos de um regime alimentar de restrição energética “lenta”, que gerou uma perda semanal de 0,7% do peso corporal, versus um regime de perda mais rápido, de 1,4% de peso por semana.

Para esse efeito, recrutaram 24 atletas que incluíram 4 sessões de treino resistido por semana no seu regime de treino habitual. Estes foram separados em dois grupos:

  • Perda de peso lenta: 0,7% do peso corporal por semana, com défice energético de 19% (± 2%), durante uma média de 8,5 (± 2,2) semanas.
  • Perda de peso rápida: 1,4% do peso corporal por semana, com défice energético de 30% (± 4%) durante uma média de 5,3 (± 0,9) semanas.

Resultados:

 

Perda lenta

Perda rápida

Peso corporal

-5.6% (± 0.8%)

-5.5% (± 0.7%)

Massa gorda

-31% (± 3%)

-21% (± 4%)

Massa magra

+2.1% (± 0.4%)

-0.2% (± 0.7%)

Visualizando a tabela acima, verificamos que, ambos os grupos tenham perdido uma % de peso similar, o grupo que perdeu peso a uma velocidade mais rápida perdeu mais massa gorda e inclusive obteve um aumento da massa magra, enquanto o grupo da perda rápida perdeu 0,2% de massa magra.

Conclusão

Para além dos estudos mencionados acima, vários estudos acompanharam regimes alimentares restritivos aplicados por atletas em preparação para competições de culturismo. Esses casos de estudo sugerem que uma perda de peso mais lenta, de 0,5%¹¹ permite reter mais massa magra, comparativamente a regimes de restrição energética mais agressivos.¹⁰ ¹²⁻¹³

Ruiz-Castellano et al. (2021), autores de uma revisão narrativa dedicada a esta tema, consideram que os atletas que se encontram em regime para perda de peso e que incluem exercício resistido no seu programa de treino, devem procurar perder entre 0,5 a 1,0% do peso corporal, para reter a maior quantidade possível de massa magra.³

Naturalmente, Indivíduos com excesso de peso/obesidade que sentem dificuldades em manter-se numa dieta hipoenergética, e que não estejam particularmente interessados em manter a sua massa muscular e a taxa metabólica basal, podem beneficiar com uma perda de peso mais rápida, na medida em que os resultados mais céleres poderão gerar maior motivação para dar continuidade à manutenção de um regime alimentar restritivo.¹⁴

➤ Mostrar/Ocultar Referências!

  1. Pasanisi F, Contaldo F, de Simone G, Mancini M. Benefits of sustained moderate weight loss in obesity. Nutr Metab Cardiovasc Dis. Dec 2001;11(6):401-6. 
  2. Anderson JW, Hamilton CC, Brinkman-Kaplan V. Benefits and risks of an intensive very-low-calorie diet program for severe obesity. Am J Gastroenterol. Jan 1992;87(1):6-15. 
  3. Ruiz-Castellano C, Espinar S, Contreras C, Mata F, Aragon AA, Martínez-Sanz JM. Achieving an Optimal Fat Loss Phase in Resistance-Trained Athletes: A Narrative Review. Nutrients. Sep 18 2021;13(9)doi:10.3390/nu13093255
  4. Johannsen DL, Knuth ND, Huizenga R, Rood JC, Ravussin E, Hall KD. Metabolic slowing with massive weight loss despite preservation of fat-free mass. J Clin Endocrinol Metab. Jul 2012;97(7):2489-96. doi:10.1210/jc.2012-1444
  5. Smith SJ, Teo SYM, Lopresti AL, Heritage B, Fairchild TJ. Examining the effects of calorie restriction on testosterone concentrations in men: a systematic review and meta-analysis. Nutr Rev. Apr 8 2022;80(5):1222-1236. doi:10.1093/nutrit/nuab072
  6. Heymsfield SB, Ludwig DS, Wong JMW, et al. Are methods of estimating fat-free mass loss with energy-restricted diets accurate? Eur J Clin Nutr. May 2023;77(5):525-531. doi:10.1038/s41430-022-01203-5
  7. Tinsley GM, Trexler ET, Smith-Ryan AE, et al. Changes in Body Composition and Neuromuscular Performance Through Preparation, 2 Competitions, and a Recovery Period in an Experienced Female Physique Athlete. J Strength Cond Res. Jul 2019;33(7):1823-1839. doi:10.1519/jsc.0000000000002758
  8. Mero AA, Huovinen H, Matintupa O, et al. Moderate energy restriction with high protein diet results in healthier outcome in women. J Int Soc Sports Nutr. Jan 25 2010;7(1):4. doi:10.1186/1550-2783-7-4
  9. Ashtary-Larky D, Bagheri R, Abbasnezhad A, Tinsley GM, Alipour M, Wong A. Effects of gradual weight loss v. rapid weight loss on body composition and RMR: a systematic review and meta-analysis. Br J Nutr. Dec 14 2020;124(11):1121-1132. doi:10.1017/s000711452000224x
  10. Garthe I, Raastad T, Refsnes PE, Koivisto A, Sundgot-Borgen J. Effect of two different weight-loss rates on body composition and strength and power-related performance in elite athletes. Int J Sport Nutr Exerc Metab. Apr 2011;21(2):97-104. doi:10.1123/ijsnem.21.2.97
  11. Tinsley GM, Trexler ET, Smith-Ryan AE, et al. Changes in Body Composition and Neuromuscular Performance Through Preparation, 2 Competitions, and a Recovery Period in an Experienced Female Physique Athlete. The Journal of Strength & Conditioning Research. 2019;33(7)
  12. Kistler BM, Fitschen PJ, Ranadive SM, Fernhall B, Wilund KR. Case study: Natural bodybuilding contest preparation. Int J Sport Nutr Exerc Metab. Dec 2014;24(6):694-700. doi:10.1123/ijsnem.2014-0016
  13. Robinson SL, Lambeth-Mansell A, Gillibrand G, Smith-Ryan A, Bannock L. A nutrition and conditioning intervention for natural bodybuilding contest preparation: case study. J Int Soc Sports Nutr. 2015;12:20. doi:10.1186/s12970-015-0083-x
  14. Purcell K, Sumithran P, Prendergast LA, Bouniu CJ, Delbridge E, Proietto J. The effect of rate of weight loss on long-term weight management: a randomised controlled trial. The Lancet Diabetes & Endocrinology. 2014;2(12):954-962. 


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