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Qual a melhor forma de avaliar a composição corporal de praticantes de musculação?

Uma vez que têm como objetivo maximizar os ganhos de massa muscular com o menor acúmulo de gordura possível, e também perder gordura retendo a maior quantidade possível de massa muscular, a monitorização regular da composição corporal tem uma importância central para os praticantes de musculação e competidores de culturismo.

De facto, a obtenção de valores relativos à quantidade de massa magra e de massa gorda é crucial pois permite avaliar a eficácia do regime de treino e do planeamento alimentar, e efetuar os ajustes necessários. Esses valores também são necessários para determinar as necessidades energéticas e de nutrimentos.

Para esse efeito, é necessário aplicar uma metodologia de avaliação da composição corporal que seja fiável e suficientemente precisa para detetar pequenas mudanças.

Entre a grande variedade de métodos existentes para avaliar a composição corporal, qual será o mais adequado para praticantes de musculação e culturistas?

O Estudo

Já foi conduzido um estudo que comparou diferentes métodos de avaliação da composição corporal.

Estes investigadores avaliaram a composição corporal de um grupo de culturistas antes e no final de 8 semanas, durante as quais treinaram e alimentaram-se com o objetivo de ganhar massa muscular e diminuir a massa gorda, com a aplicação concomitante de hormonas anabolizantes.

Todos os culturistas tinham pelo menos 3 anos de experiência e treinavam no mínimo 4 dias por semana, num total de cerca de 8-9 horas por semana.

Neste estudo o modelo 4C serviu de “gold standard” para efeitos de comparação com 8 outros métodos: a densitometria (pesagem debaixo de água), a hidrometria (diluição de deutério), DEXA, o modelo 3Cw que incorpora a água corporal total; e o modelo 3Cb, o qual incorpora os valores dos minerais ósseos, IMC, pregas cutâneas e bioimpedância.

De forma a não tornar o artigo demasiado longo, irei apenas descrever os métodos mais relevantes para a maioria dos leitores.

  • Densitometria: Neste estudo foi usada a pesagem hidrostática (debaixo de água), em jejum, para determinar a composição corporal a partir da densidade corporal e do volume corporal. Usa o princípio de deslocamento de Arquimedes.
  • Hidrometria (diluição por deutério): Neste caso o indivíduo ingere uma bebida contendo uma quantidade de isótopos de hidrogénio, sendo depois analisada a sua concentração na urina com um espectrómetro de massa. Isto permite estimar a quantidade total de água presente no organismo.
  • DEXA: A absortometria radiológica de dupla energia (DEXA) permite determinar a composição corporal do indivíduo a partir da resistência gerada pelos tecidos corporais a 2 feixes de raios x.
  • Bioimpedância: Neste método é estimada a quantidade de gordura e de massa magra a partir da resistência (impedância) gerada após a aplicação de uma corrente elétrica de baixa intensidade. A massa magra é um melhor condutor devido a conter uma maior percentagem de água e eletrólitos e a gordura é um tipo de tecido mais resistente. Naturalmente, o estado hidratação do indivíduo irá influenciar os resultados de forma significativa.
  • Pregas cutâneas: Este método usa equações que incorporam os valores da espessura de pregas cutâneas para prever a % de massa gorda. Neste caso foram usados os valores das pregas cutâneas dos bíceps, tríceps, subescapular e suprailíaca. A densidade corporal foi calculada usando a equação de Durnin and Womersley e a partir desse valor usou-se a equação de Siri para estimar a % de massa gorda: %MG = (4.95/Densidade +50) x 100.
  • IMC: O índice de massa corporal (IMC) é um método que classifica os indivíduos de acordo com o seu peso para a altura. O valor é obtido dividindo o peso corporal, em kg, pela altura em metros ao quadrado (kg/altura2). Neste estudo, a % massa gorda foi calculada através da seguinte equação: %MG = 1,20 x IMC +23 x Idade - 10.8 x género - 5.4 (idade em anos, género masculino= 1)
  • Modelo de 4 compartimentos: Incorpora os valores obtidos por vários métodos, nomeadamente o teor total de água obtido pela hidrometria (diluição por deutério), o conteúdo mineral ósseo total a partir do DEXA, e a densidade corporal obtido pela densitometria (pesagem hidrostática).
  • Modelo de 3 compartimentos: Este modelo incorpora a densidade corporal obtido pela densitometria (pesagem hidrostática), e o teor total de água obtido pela hidrometria (diluição por deutério) (3Cw), ou do conteúdo mineral ósseo total a partir do DEXA (3Cb).

Resultados

De uma forma global, o modelo 3Cw foi dos que apresentou menor percentagem de viés (0,26%) e de erro (0,69%), comparativamente ao método de referência (modelo de 4 compartimentos).

O segundo melhor método terá sido o da pesagem hidrostática, com um viés de -0,09% e 2,39% de erro.

O viés para o método das pregas cutâneas também foi bastante baixo (0,29%), embora o valor da % de erro tenha sido relativamente elevado, de 3,04%.

Os métodos do IMC e da Bioimpedância foram dos que apresentaram valores de viés e de erro mais elevados.

Discussão e conclusão

Os autores deste trabalho concluíram:

As mudanças na composição corporal após uma intervenção são mais bem monitoradas pelo modelo 3Cw (pequeno viés de 0,3% de gordura corporal, pequeno erro de 0,69% de gordura corporal).

No entanto, e embora o modelo 3Cw e a densitometria tenham obtido os melhores resultados, na prática poucos de nós irão ter acesso a este tipo de equipamentos.

No mundo real torna-se necessário usar métodos de avaliação que, mesmo não representando o “gold standard” são suficientemente rápidos, económicos, práticos e precisos para serem aplicados de forma frequente.

Dos vários métodos aqui descritos, aqueles que a maioria dos praticantes de musculação poderiam realisticamente aplicar seriam o IMC, a bioimpedância e as pregas cutâneas.

Contudo, neste estudo pudemos verificar que a avaliação da monitorização da composição corporal a partir do IMC é uma péssima ideia e é de longe o método menos preciso.

A bioimpedância também foi dos métodos que apresentou piores resultados e tem o inconveniente de ser muito influenciado pelo estado de hidratação do indivíduo, que pode variar de forma significativa.

Resta-nos o método da medição das pregas cutâneas, com recurso a um lipocalibrador que, quando efetuada por um técnico experiente, poderá proporcionar valores com uma margem de erro relativamente baixa.

Referência!

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