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Quais são as recomendações de gordura para atletas?

A gordura corporal representa o principal reservatório de energia do corpo humano.(1) Enquanto que a energia armazenada em forma de hidratos de carbono pode fornecer de 1500 kcal até 3000 kcal, a gordura corporal de indivíduo com 80 kg pode providenciar cerca de 110000 kcal.(1, 2)

De facto, os ácidos gordos providenciam mais ATP por molécula do que a glicose. Uma molécula de glicose pode produzir 38 ATP enquanto uma molécula de ácido esteárico pode produzir 147 ATP. No entanto, para produzir a mesma quantidade de ATP, a oxidação de ácidos gordos requer mais oxigénio do que a oxidação de hidratos de carbono.(2)

Quais são as recomendações de gordura para atletas?

As 3 associações mais acreditadas da área da nutrição desportiva, nomeadamente a American College of Sports Medicine (ACSM), a International Society for Sports Nutrition (ISSN) e a International Olympic Committee (IOC) referem que a ingestão de gordura para atletas deverá ser similar ou ligeiramente superior à ingestão recomendada para a população em geral e recomendam valores que vão de 20% a 35% da ingestão energética total.(3-6)

 

ACSM(3, 6)

ISSN(4)

IOC(5)

Ingestão recomendada

20-35% do VET

~30% do VET

>15-20% do VET

Razões para não restringir demasiado a ingestão de gordura

Eventualmente, os atletas poderão optar por restringir de forma excessiva a sua ingestão de gordura para conseguirem perder peso ou gordura.(7) No entanto, existem várias razões para não restringir a ingestão de gordura em demasia.

  • A gordura é uma fonte de energia, de ácidos gordos essenciais, de vitaminas lipossolúveis (A, D, E, K) e de elementos essenciais para as membranas celulares.(6) (8)
  • -Os ácidos gordos ómega-3 são essenciais para a saúde geral do atleta e alguns trabalhos sugerem que a dieta ocidental fornece um rácio de ácidos gordos n-6 para n-3 que varia de 10:1 a 20:1, o que pode resultar em inflamação excessiva e interferir de forma negativa na recuperação pós-exercício.(7, 9)
  • A restrição excessiva de gordura pode reduzir os níveis de testosterona,(10-14) tendo-se observado uma redução de 12% dos androgénios em circulação, após 8 semanas, em voluntários que seguiram uma dieta pobre em gordura.(10)

Razões para não ingerir uma quantidade excessiva de gordura

Se por um lado não é recomendável seguir dietas com um teor demasiado baixo de gordura, as dietas ricas em gordura também não parecem ser uma boa opção para atletas.(3, 4, 6)

A este respeito, a International Society for Sports Nutrition refere que:

Durante anos, as dietas ricas em gordura têm vindo a ser usadas por atletas, com a maioria da evidência a não mostrar nenhum benefício ergogénico e dificuldades gastrointestinais.(4)

E a American College of Sports Medicine alega que:

Em geral, as dietas ricas em gordura parecem reduzir, em vez de potenciar, a flexibilidade metabólica ao reduzir a disponibilidade de hidratos de carbono e a capacidade de os usar de forma eficiente como substrato energético. Portanto, não será boa ideia que os atletas de competição sacrifiquem a sua capacidade de realizar treino de alta intensidade ou esforços de alta intensidade durante a competição, o que poderia comprometer os resultados.(6)

Para além disso, o favorecimento da ingestão de gordura (>30% da ingestão energética total), poderá provocar uma diminuição da ingestão de hidratos de carbono, o que por sua vez poderá ter efeitos negativos no rendimento físico.(5)

Conclusão

De uma forma geral, recomenda-se que os atletas ingiram uma quantidade moderada de gordura, entre 20 a 30% da sua ingestão energética total.(3, 4, 6)

Obviamente, para além de uma quantidade adequada de gordura, o plano alimentar de um atleta deverá incluir quantidades adequadas de proteína, hidratos de carbono, água e de vários outros nutrientes essenciais para uma saúde e rendimento ótimo do atleta.(6)

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  1. Jensen J, Rustad PI, Kolnes AJ, Lai Y-C. The role of skeletal muscle glycogen breakdown for regulation of insulin sensitivity by exercise. Frontiers in physiology. 2011; 2:112-12.
  2. Jeukendrup AE, Saris WH, Wagenmakers AJ. Fat metabolism during exercise: a review. Part I: fatty acid mobilization and muscle metabolism. International journal of sports medicine. 1998; 19(4):231-44.
  3. Rodriguez NR, DiMarco NM, Langley S. Position of the American Dietetic Association, Dietitians of Canada, and the American College of Sports Medicine: Nutrition and athletic performance. Journal of the American Dietetic Association. 2009; 109(3):509-27.
  4. Kerksick CM, Wilborn CD, Roberts MD, Smith-Ryan A, Kleiner SM, Jager R, et al. ISSN exercise & sports nutrition review update: research & recommendations. J Int Soc Sports Nutr. 2018; 15(1):38.
  5. Potgieter S. Sport nutrition: A review of the latest guidelines for exercise and sport nutrition from the American College of Sport Nutrition, the International Olympic Committee and the International Society for Sports Nutrition. South African journal of clinical nutrition. 2013; 26(1):6-16.
  6. Thomas DT, Erdman KA, Burke LM. American College of Sports Medicine Joint Position Statement. Nutrition and Athletic Performance. Medicine and science in sports and exercise. 2016; 48(3):543-68.
  7. Oliveira C, Ferreira D, Caetano C, Granja D, Pinto R, Mendes B, et al. Nutrition and supplementation in soccer. Sports. 2017; 5(2):28.
  8. Trumbo P, Schlicker S, Yates AA, Poos M. Dietary reference intakes for energy, carbohdrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol, protein and amino acids. Journal of the Academy of Nutrition and Dietetics. 2002; 102(11):1621.
  9. Simopoulos AP. Omega-3 fatty acids and athletics. Current sports medicine reports. 2007; 6(4):230-6.
  10. Wang C, Catlin DH, Starcevic B, Heber D, Ambler C, Berman N, et al. Low-Fat High-Fiber Diet Decreased Serum and Urine Androgens in Men. The Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism. 2005; 90(6):3550-59.
  11. Hamalainen EK, Adlercreutz H, Puska P, Pietinen P. Decrease of serum total and free testosterone during a low-fat high-fibre diet. Journal of steroid biochemistry. 1983; 18(3):369-70.
  12. Hamalainen E, Adlercreutz H, Puska P, Pietinen P. Diet and serum sex hormones in healthy men. Journal of steroid biochemistry. 1984; 20(1):459-64.
  13. Dorgan JF, Judd JT, Longcope C, Brown C, Schatzkin A, Clevidence BA, et al. Effects of dietary fat and fiber on plasma and urine androgens and estrogens in men: a controlled feeding study. The American journal of clinical nutrition. 1996; 64(6):850-5.
  14. Reed MJ, Cheng RW, Simmonds M, Richmond W, James VH. Dietary lipids: an additional regulator of plasma levels of sex hormone binding globulin. The Journal of clinical endocrinology and metabolism. 1987; 64(5):1083-5.

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