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Quais as melhores fontes de proteína vegetal?

Os padrões alimentares vegetarianos e veganos, caracterizados pela exclusão de carne e pescado (com inclusão, ou não, de ovos e/ou lacticínios), têm sido alvo de maior interesse, inclusivamente por praticantes de exercício físico, e atletas1.

Apesar destes padrões de consumo atenderem ou, até excederem as recomendações proteicas, frequentemente, fornecem menos proteína do que as dietas não vegetarianas2,3.

Acrescendo a menor qualidade proteica das proteínas de origem vegetal, levantam-se algumas preocupações em torno da ingestão proteica dos atletas vegetarianos, e sugere-se um maior cuidado no planeamento para atender às necessidades relacionadas com os seus objetivos de treino.

Nos estudos até à data, uma alimentação vegetariana bem planeada parece suportar os parâmetros relacionados com a performance desportiva4.

Num trabalho em que os participantes foram sujeitos a um protocolo de treino de resistência de 12 semanas, verificaram-se aumentos similares de força muscular e de ganhos de massa magra, tanto no grupo cujo consumo proteico era primariamente proveniente da carne, como no grupo que consumia principalmente soja (numa dieta de base ovo-lacto-vegetariana). Estes resultados sugerem que a maior dependência das fontes proteicas vegetais não influencia a resposta ao treino, quando as necessidades energéticas e proteicas são atingidas5.

Para maximizar a acreção proteica muscular associada ao treino de resistência, é recomendada uma ingestão proteica diária entre 1,6 e 2,2 g.kg-1 de peso corporal, sendo que fontes de proteína de elevada qualidade (lácteos, carne e ovos) são frequentemente enfatizadas, por fornecerem uma fonte concentrada de aminoácidos essenciais, incluindo leucina, de forma a maximizar a síntese proteica muscular (SPM)6.

Propriedades anabólicas das proteínas vegetais

A síntese de proteína muscular (SPM), enquanto processo constante, responsivo ao exercício físico e à ingestão proteica, é a principal responsável pelas mudanças na massa muscular7.

A resposta da SPM pode variar substancialmente entre diferentes tipos e fontes alimentares de proteína, dependendo da disponibilidade pós-prandial de aminoácidos essenciais (e de leucina em particular) para o músculo. Esta disponibilidade de aminoácidos é regulada por alguns processos fisiológicos, mas, também, por fatores dietéticos, incluindo a composição em aminoácidos, conteúdo em aminoácidos essenciais, e presença de fatores antinutricionais8.

Quando analisada a resposta da SPM à ingestão de proteínas de origem vegetal, alguns trabalhos reportaram uma resposta de menor magnitude com a ingestão de fontes proteicas como a soja9-11 e o trigo12, relativamente a proteínas de origem animal.

No que diz respeito aos ganhos de massa magra associada ao treino de resistência, a ingestão de proteína de soja também levou a menores ganhos de massa magra13,14. No entanto, nem todos os trabalhos verificaram a superioridade da proteína whey relativamente à soja15,16 (nestes estudos as dietas dos participantes continham 1,2 e 1,6 a 1,9 g.kg-1 de proteína, respetivamente, sem a inclusão do suplemento) ou, à proteína de arroz17.

Neste trabalho, em que se estudou o efeito da suplementação de proteína de arroz relativamente à proteína whey, não se verificaram diferenças nos ganhos de força e de massa magra, possivelmente devido à quantidade de proteína ingerida (48 g), que fornecia 5,5 e 3,8 g de leucina, na bebida de whey e arroz, respetivamente (acima dos 2,0 a 3,5 g de leucina, valores para os quais a SPM é estimulada de forma máxima)18.

A menor resposta na SPM evidenciada nestes trabalhos poderá dever-se à menor qualidade proteica das proteínas de origem vegetal. A qualidade de uma fonte proteica é determinada pelo conteúdo em aminoácidos e pela digestibilidade.

Fontes proteicas de origem animal apresentam uma digestibilidade superior a 90%, enquanto que no caso das fontes proteicas de origem vegetal é mais baixa, entre 45 a 80%19. Como tal, uma menor quantidade de proteína presente nos alimentos de origem vegetal é realmente absorvida, resultando numa menor disponibilidade de aminoácidos.

A menor digestibilidade proteica advém da presença de fatores antinutricionais como os inibidores das protéases (tripsina e quimiotripsina), lectinas, fitatos e taninos7,20. A aplicação de métodos de processamento alimentar tradicionais, como a demolha e o cozimento, representa uma estratégia eficaz para aumentar a biodisponibilidade nutricional, através da inativação ou redução de fatores antinutricionais21-23.

Quanto à composição em aminoácidos, embora as proteínas de origem vegetal contenham todos os aminoácidos essenciais, a quantidade de um ou dois aminoácidos é mais baixa, nomeadamente de: lisina (nos cereais), metionina (leguminosas), triptofano (alguns cereais, como o milho) ou, treonina (alguns cereais)24; e, quando um dado aminoácido essencial é limitante, a síntese proteica pode ser comprometida19.

Algumas estratégias teóricas que poderão melhorar a sensibilidade do tecido muscular esquelético às propriedades anabólicas das proteínas vegetais são propostas por alguns autores, e incluem:

Aumento da quantidade de proteína: Uma maior dose de proteína por refeição poderá levar a uma ingestão superior de aminoácidos essenciais, compensando a menor proporção de leucina, lisina e/ou metionina25 – uma hipótese testada em alguns trabalhos mencionados previamente12,17. Assim, na prática, é sensato aumentar a ingestão proteica diária para valores mais próximos do limite superior da recomendação de 1,6 a 2,2 g.kg-1 de peso corporal.

Mistura de proteínas: A combinação de diferentes proteínas de origem vegetal, nomeadamente de proteínas com menor teor de lisina (trigo, arroz, cânhamo e milho) com proteínas com menor conteúdo em metionina (feijão, soja, lentilha e ervilha), compensa o menor teor destes aminoácidos essenciais, e permite a obtenção de um perfil de aminoácidos mais “completo” (figura 1), podendo, em teoria, melhorar a resposta pós-prandial da SPM, quando comparada com a ingestão de uma fonte proteica de origem vegetal singular25.

Fortificação com leucina: O conteúdo de leucina das proteínas de origem animal é geralmente superior às proteínas de origem vegetal (>10% e entre 6 a 8%, respetivamente). Considerando o papel deste aminoácido na sinalização e ativação dos processos relacionados com a SPM, alguns autores sugerem a adição de leucina livre às fontes proteicas vegetais7,25. Recentemente, o grupo de trabalho de Churchward-Venne et al. (2019) analisou o efeito da fortificação de leucina na proteína de soja, não tendo evidenciado diferenças nas taxas de síntese proteica após a co-ingestão de hidratos de carbono com: 20 g de proteína whey, proteína de soja, ou, proteína de soja fortificada com leucina (em quantidade suficiente para igualar o teor da proteína whey)26.

Apresentadas algumas considerações relativas às potenciais limitações em termos de qualidade das proteínas de origem vegetal, analisamos o valor nutricional de alguns alimentos.

Melhores fontes de proteína vegetal

Leguminosas

As leguminosas representam um grupo de alimentos que se pode dividir em duas categorias: os grãos (no qual se incluem o feijão, o grão-de-bico, a lentilha, a ervilha, a fava e o tremoço, secos) e as oleaginosas (a soja e o amendoim). Esta categorização influencia a composição nutricional, por isso, neste ponto, analisaremos apenas o primeiro grupo.

As leguminosas (grãos) fornecem cerca de 20 a 30 % do Valor Energético Total (VET) na forma de proteína e, a inclusão deste grupo também assegura uma ingestão mais adequada de lisina (aminoácido limitante nos cereais) nos padrões alimentares vegetarianos.

Nutricionalmente, também fornecem hidratos de carbono (60 a 70 % do VET), fibra, apresentam um baixo teor de gordura, e são fonte de vitaminas do complexo B (especialmente folatos e tiamina), e de minerais como potássio, fósforo, magnésio e ferro.

Ainda que modestas, existem algumas diferenças nutricionais entre as leguminosas. Considerando uma porção que forneça 20 g de proteína (tabela 1), é interessante constatar que tanto pode ser necessário consumir cerca de 220 g de leguminosas cozidas comuns (lentilhas e feijão), como até 280 g de grão-de-bico ou, apenas 150 g de tremoço, e as diferenças em termos do valor energético associado a cada porção (a porção de feijão contém o dobro do valor energético da porção de tremoço).

Entre o tremoço e as restantes leguminosas, salienta-se também a diferença no conteúdo em fibra, superior a 10 g (um aspeto a ter em consideração no planeamento de uma dieta vegetariana, dado que os alimentos maioritariamente presentes nesta dieta têm tendencialmente uma menor densidade energética e um maior teor em fibra, podendo promover a saciedade precoce, e dificultar uma ingestão energética adequada).

Soja, e os seus derivados

O feijão de soja distingue-se das demais leguminosas por fornecer um maior conteúdo em proteína (cerca de 42,3 % VET27), e por apresentar uma melhor qualidade proteica (DIAAS de 89 e 84 para a farinha de soja e proteína isolada de soja28, respetivamente). Apresenta também mais gordura (sobretudo ácidos gordos insaturados, correspondendo a uma fonte do ácido α-linolénico, ALA, no padrão alimentar vegetariano29), sendo também uma boa fonte de fibra, vitaminas do complexo B (B2, B6 e folatos), mas também de minerais como potássio, fósforo, magnésio e ferro27.

Podemos encontrar uma variedade de produtos à base de soja, desde na sua forma inteira, minimamente processada (edamame, feijão de soja), ou, convertida em produtos alimentares, através do conhecimento tradicional (tofu, tempeh) ou, de intervenções tecnológicas, convertidos em formas fracionadas incluindo farinhas inteiras ou desengorduradas, concentrados, isolados, texturizados e hidrolisados30. As diferentes formas de processamento alimentar originam derivados da soja com perfis nutricionais distintos.

Tofu: A demolha, cozimento, homogeneização e filtração (com remoção da fibra) do feijão de soja permite a obtenção da bebida de soja. Esta, por sua vez, quando submetida ao calor, e à ação de coagulantes (como o sulfato de cálcio), forma um coalho, o tofu31. O tofu é fonte de proteína, e distingue-se do feijão de soja por concentrar um maior teor de gordura total, e menor de hidratos de carbono e fibra. É também rico em cálcio, e fonte de fósforo, magnésio, ferro e zinco.

Tempeh: Produzido através da fermentação (predominantemente com o fungo Rhizopus oligoporus) dos feijões de soja cozinhados, descascados, e compactados num bloco31. Nutricionalmente, preserva o conteúdo em fibra, gordura e proteína, apresentando um valor nutricional próximo ao do feijão de soja cozido.

Proteína Texturizada de Soja: A extração da fração lipídica da soja para produção de óleo resulta numa farinha desengordura, da qual é obtida a proteína texturizada de soja. Este produto, reconstituído mediante a hidratação, e de aplicação culinária versátil, distingue-se nutricionalmente por ser mais concentrado em proteína (62,9 % VET), hidratos de carbono e fibra, de baixo teor em gordura, apresentando também um menor conteúdo em isoflavonas (em mg/g de proteína) relativamente aos demais produtos derivados da soja32.

Para quem é vegetariano, e evita o consumo de soja, saliento que, com exceção da alergia à soja, não existe evidência que indique que o seu consumo poderá levar a efeitos negativos na saúde humana32.

Por outro lado, tendo em conta o princípio da moderação, e a variedade de fontes proteicas disponíveis analisadas neste artigo, também não há necessidade de consumir apenas soja para a obtenção de proteína.

Poderão ser incluídas outras fontes alimentares para atingir as necessidades proteicas sendo que o uso de soja pode ser limitado ao gosto pessoal e aos hábitos alimentares individuais.

Seitan

O seitan, é tradicionalmente produzido através da remoção em água dos grânulos de amido da massa de farinha de trigo, concentrando apenas a rede proteica insolúvel (glúten). Do ponto de vista nutricional, preserva uma quantidade significativa de proteína (77,4 % VET), aliado a um baixo teor de hidratos de carbono e gordura33. Apesar do elevado teor proteico, apresenta uma menor quantidade em aminoácidos essenciais e, quantidades limitantes do aminoácido essencial lisina25.

Proteínas vegetais isoladas

Se atingir uma ingestão adequada de proteína através dos alimentos for difícil, ou inconveniente, a inclusão de proteínas vegetais isoladas poderá ser uma opção. Atualmente, é possível encontrar uma maior variedade de suplementos de proteína de origem vegetal, incluindo de soja, ervilha, arroz, cânhamo e trigo (e também misturas destas proteínas isoladas)1.

Mas, existe alguma fonte proteica, ou mistura, de origem vegetal, que seja melhor?

Gorissen et al. (2018) analisaram o teor de aminoácidos essenciais de 10 proteínas isoladas de diferentes fontes vegetais. Destas, destacaram-se as proteínas de soja, arroz, ervilha, milho, e batata, pelo seu conteúdo total de aminoácidos essenciais, e de leucina, que supriram as recomendações de aminoácidos definidas pelo parecer conjunto da FAO/WHO/ONU (por oposição às proteínas isoladas de aveia, tremoço, trigo, cânhamo e microalgas).

Dado o conteúdo variável em metionina e lisina entre as diferentes proteínas, os autores sugerem a combinação numa proporção de 50/50 das proteínas de milho ou arroz, com soja ou ervilha, permitindo uma mistura com um perfil de aminoácidos mais "completo", numa dose de proteína menor8.

Outros alimentos

Para além dos alimentos acima analisados, existem outras opções que poderão ter uma contribuição modesta na ingestão proteica (e que fornecem outros nutrientes a ter em consideração numa dieta vegetariana), nomeadamente:

  • Sementes de cânhamo, que concentram numa porção de 15 g (aproximadamente 2 colheres de sopa) 83 kcal e 4,7 g de proteína (22,8 % VET);
  • Sementes de abóbora, cuja porção de 15 g fornece 84 kcal e 4,5 g de proteína (21,6 % VET);
  • Amendoins (miolo, sem adição de sal ou gordura): 30 g ou, um punhado, fornece 170 kcal e 7,7 g de proteína (18,2 % VET);

Por fim, existem outros alimentos que são frequentemente identificados como fontes proteicas na alimentação vegetariana, mas que, nas porções consumidas, fornecem uma quantidade de proteína pouco significativa.

É, o caso dos cogumelos que, apesar da elevada contribuição da proteína para o seu valor energético (56,2 %), devido ao elevado teor de água (92,5 %), seria necessário consumir uma porção enorme para obter uma quantidade razoável de proteína; ou, dos pseudo-cereais (amaranto, quinoa e trigo sarraceno) que embora apresentem um perfil de aminoácidos mais equilibrado, fornecem uma quantidade de proteína absoluta baixa nas quantidades frequentemente consumidas (tabela 3).

Por isso, para quem visa otimizar o seu consumo de proteína em função dos objetivos de composição corporal, não deverá fazer destes alimentos a fonte proteica principal das refeições.

Considerações finais

  • A menor digestibilidade, menor conteúdo em aminoácidos essenciais, e o teor mais baixo de leucina, lisina e/ou metionina poderão ser responsáveis pela menor capacidade anabólica associada às proteínas de origem vegetal, relativamente às proteínas de origem animal.
  • Algumas estratégias que poderão melhorar as propriedades anabólicas das proteínas vegetais incluem: o aumento da quantidade de proteína por dose, a mistura de fontes proteicas e, a fortificação da fonte proteica com leucina.
  • As fontes proteicas de origem vegetal - leguminosas e os análogos da carne (tofu, tempeh, proteína texturizada de soja e seitan) - são marcadas por diferenças nutricionais significativas, dependentes do alimento em particular, e do processamento alimentar implicado.
  • Alguns alimentos poderão ser percecionados como fontes de proteína nas dietas vegetarianas, no entanto, é fulcral considerar o contexto e a porção de consumo.
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