Nos últimos anos, o desenvolvimento de métodos e técnicas de análise laboratoriais fomentou o interesse e possibilitou o aumento do conhecimento científico na área do microbioma humano na saúde e na doença (1).
Paralelamente, observou-se um crescimento rápido do interesse pela suplementação com probióticos, atribuído principalmente à evolução da evidência da interação do microbioma humano com a saúde e a doença (2).
A área da nutrição no desporto não foi exceção e em 2014 foi publicada a primeira evidência de que o exercício poderia aumentar a diversidade microbiana intestinal em humanos (3).
Posteriormente, estudos do microbiota intestinal de atletas de alto rendimento emergiram, assim como o número de produtos contendo probióticos direcionados para praticantes de exercício.
Feita esta breve contextualização e antes de prosseguir é importante definir dois conceitos: microbiota intestinal e probióticos.
O que é o microbiota intestinal?
Diversos órgãos e locais do corpo humano são habitados por diversos microrganismos, nomeadamente bactérias, leveduras, fungos entre outros, e cujo equilíbrio entre eles é fundamental para a saúde do hospedeiro.
O microbiota intestinal designa os microrganismos que coletivamente habitam o intestino, sendo neste órgão, mais especificamente no cólon, onde se encontram em maior abundância (4).
Estes microrganismos desempenham diversas funções importantes (ex.: produção de vitaminas (5), digestão de fibra (6), modulação do sistema imunitário (7)), contribuindo significativamente para a saúde e doença (8).
O que são probióticos?
De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura e a Organização Mundial de Saúde (FAO/WHO), “probióticos são microrganismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, conferem benefícios à saúde de quem os toma” (9).
No que diz respeito à sua comercialização, podem encontrar-se sob a forma de cápsulas ou comprimidos, saquetas (pó), líquidos ou em alimentos (ex.: iogurtes) (10). Os probióticos são quantificados em unidades formadoras de colónias (UFC), que indicam o número de células viáveis.
No âmbito da nutrição no desporto, o interesse pela utilização de probióticos e a investigação científica (ainda incipiente) têm recaído essencialmente sobre o sistema imunitário, mas os efeitos demonstrados são ainda modestos.
Ainda assim, são cada vez mais as possibilidades que surgem associadas à sua utilização e cuja evidência científica é ainda bastante escassa. Uma delas é o possível impacto a nível muscular que será abordado em seguida.
Em 2016, um estudo que comparou a administração de Bacillus coagulans GBI-30, 6086 (1x109 UFC) em conjugação com 20 g de caseína com a ingestão de apenas 20 g de caseína, concluiu que a suplementação de probióticos com proteína tende a reduzir índices de dano muscular e a melhorar a recuperação (11).
Não obstante, embora os resultados pareçam promissores, o probiótico foi tomado em conjunto com um suplemento de proteína, o que poderá ter influenciado os resultados.
Nível taxonómico | Nome |
Género | Bacillus |
Espécie | Bacillus coagulans |
Estirpe | Bacillus coagulans GBI-30, 6086 |
Tabela 1: Exemplo dos nomes da bactéria (Bacillus coagulans GBI-30, 6086) em diferentes níveis taxonómicos
Mais recentemente, um estudo conduzido em roedores comparou os efeitos da administração da estirpe Bifidobacterium breve B-3 na forma viva (i.e., probiótico) com a forma inativada pelo calor, na função muscular (12).
Os resultados foram interessantes pois os investigadores observaram que a forma inativada pelo calor produziu efeitos mais fortes do que a forma viva, tendo levando ao aumento da massa muscular nestes animais.
Os autores referiram que os mecanismos pelo qual a inativação pelo calor potencia os efeitos da bactéria Bifidobacterium breve B-3 ainda requerem explicação, mas especularam que certos componentes celulares poderão induzir a produção de fatores bioativos, como citocinas ou hormonas.
Investigações em roedores devem sempre observados com prudência pois os efeitos não podem, na sua maioria, ser extrapolados para humanos.
É importante ter em consideração que nos casos em que são demonstrados benefícios derivados da administração de probióticos, estes são dependentes da estirpe, espécie e da dose ingerida. Além disso, os efeitos podem diferir de pessoa para pessoa, consoante o seu estado de saúde e hábitos alimentares.
Deixando agora um pouco de parte a suplementação com probióticos e tendo em consideração o papel essencial que a alimentação tem na construção e modulação do microbiota intestinal (13), é relevante mencionar um estudo recente que investigou o impacto de diferentes modalidades desportivas e os regimes alimentares delas característicos no microbiota intestinal dos seus praticantes.
A investigação consistiu na comparação de indivíduos com hábitos de exercício regulares (grupo controlo), bodybuilders e corredores de longa distância (14).
Primeiramente, foi observado que a modalidade praticada estava associada ao padrão alimentar dos atletas (bodybuilders: dieta rica em proteica, rica em gordura, baixa em hidratos de carbono e baixa em fibra; corredores de longa distância: dieta baixa em hidratos de carbono e baixa em fibra).
Relativamente aos resultados, por exemplo, foi reportado que espécies de bactérias consideradas benéficas e que são frequentemente utilizadas como probióticos (grupo Bifidobacterium adolescentis, grupo Bifidobacterium longum e grupo Lactobacillus sakei) e outras produtoras de ácidos gordos de cadeia curta estavam reduzidas no grupo dos bodybuilders e presentes em maiores quantidades no grupo controlo. Os autores apontaram como justificação a ingestão inadequada de hidratos de carbono e fibra.
Em suma, não existe até à data evidência científica que suporte o recurso à suplementação com probióticos para aumentar a força ou a massa muscular. Um dia até poderá fazer sentido, mas até lá, a adoção de uma alimentação nutricionalmente equilibrada e com um aporte adequado de fibra, deverá ser promovida.
Autor: Catarina Oliveira
➤ Mostrar/Ocultar Referências!
- Lloyd-Price J, Abu-Ali G, Huttenhower C. The healthy human microbiome. Genome Med. 2016;8(1):51.
- Day RL, Harper AJ, Woods RM, Davies OG, Heaney LM. Probiotics: current landscape and future horizons. Future Sci OA. 2019;5(4):FSO391-FSO.
- Clarke SF, Murphy EF, O'Sullivan O, Lucey AJ, Humphreys M, Hogan A, et al. Exercise and associated dietary extremes impact on gut microbial diversity. Gut. 2014;63(12):1913-20.
- Dethlefsen L, McFall-Ngai M, Relman DA. An ecological and evolutionary perspective on human-microbe mutualism and disease. Nature. 2007;449(7164):811-8.
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- Jäger R, Mohr AE, Carpenter KC, Kerksick CM, Purpura M, Moussa A, et al. International Society of Sports Nutrition Position Stand: Probiotics. J Int Soc Sports Nutr. 2019;16(1):62-.
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- Zmora N, Suez J, Elinav E. You are what you eat: diet, health and the gut microbiota. Nature Reviews Gastroenterology & Hepatology. 2019;16(1):35-56.
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