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Gorduras trans - quais os riscos para a saúde?

No final do século XIX assistiu-se ao surgimento do ácido elaídico, um tipo de gordura trans (ou parcialmente hidrogenada), artificial, que até essa altura não existia e que não se encontra na natureza.

O ácido elaídico é produzido a partir de um ácido gordo insaturado natural (ácido oleico), através de um processo no qual o óleo vegetal é aquecido e exposto a hidrogénio num recipiente fechado (1).

Este tipo de gordura é utilizado sobretudo em produtos como margarinas, óleos vegetais, batatas-fritas, pipocas, refeições pré-preparadas e também em produtos de confeitaria, biscoitos, e outros alimentos processados.

A sua utilização pela indústria alimentar é conveniente por possuir propriedades culinárias interessantes em comparação com outros tipos de gordura. A gordura trans é mais resistente à oxidação (rancificação) e mais estável do que os óleos vegetais. Isso permite aumentar o período de vida de prateleira de vários produtos alimentares processados (2, 3).

Gordura trans - quais os riscos para a saúde?

A ingestão de ácido elaídico (1, 3-10):

  • Aumenta os níveis de colesterol total.
  • Aumenta os níveis de colesterol LDL (o colesterol mau).
  • Diminui os níveis de colesterol HDL (o colesterol bom).
  • Eleva os níveis de triglicerídeos.
  • Provoca inflamação e calcificação das veias e artérias.
  • Aumenta a probabilidade de formação de coágulos sanguíneos.
  • Aumenta o risco de acidente vascular cerebral.
  • Aumenta os níveis de vários marcadores inflamatórios, incluindo proteína C-reactiva e interleucina-6.
  • Aumenta o risco de cancro da mama.
  • Aumenta o risco de pré-eclâmpsia (hipertensão durante a gravidez).
  • Aumenta o risco de problemas de desenvolvimento neurológico do feto e de crescimento nas crianças.
  • Aumenta o risco de infertilidade na mulher.
  • Aumenta o risco de cancro do cólon.
  • Aumenta a resistência à insulina e o risco de diabetes tipo II.
  • Promove o aumento da gordura visceral e o excesso de peso.
  • Aumenta o risco de pedras nos rins.
  • Aumenta o risco de doença de Alzheimer.
  • Aumenta o risco de vários tipos de alergias (asma, urticária ao frio e eczema) nas crianças.
  • Provoca a diminuição de capacidades cognitivas, incluindo uma redução da capacidade de memorização e de aprendizagem.
  • Está associada a um agravamento da Acne Vulgaris.
  • Aumenta o risco de morte por todas as causas.

Na verdade, a literatura científica atual não deixa dúvidas de que a ingestão de ácido elaídico aumenta de forma significativa o risco de vir a sofrer de doenças cardiovasculares (11).

Verificou-se que a ingestão de apenas 5 gramas por dia de gordura trans aumenta em 23% o risco de problemas cardiovasculares, estando ainda associada a um aumento do risco de morte por todas as causas (5-9, 11, 12).

Várias organizações de saúde têm vindo a alertar para as consequências negativas da ingestão de gorduras trans e a tomar iniciativas que levem à redução do seu consumo.

Entre elas encontramos a World Health organization (WHO), a American Heart Association, a American Dietetic Association, o Institute of Medicine, a US Dietary Guidelines, e a National Cholesterol Education Program Adult Treatment Panel (13, 14).

Todas elas indicam a necessidade de reduzir ao máximo ou a ingestão de gorduras trans, salientando ainda que não existe justificação médica para a sua presença na dieta do ser humano.

Recentemente, a Food and Drug Administration dos EUA lançou um comunicado no qual refere que as gorduras trans são prejudiciais para a saúde do ser humano e anunciou a sua intenção de proibir completamente a adição de gorduras trans na alimentação humana a partir de 2018 (15).

Também está comprovado que as estratégias e políticas que visam reduzir a ingestão de gorduras trans traduzem-me em resultados positivos na saúde pública, nomeadamente em termos de redução de mortes por doenças cardiovasculares (16).

A Dinamarca é um exemplo de um país que aprovou e aplicou legislação que visou reduzir e restringir a quantidade de gorduras trans presente nos alimentos. A acompanhar essa redução, ao longo de 30 anos observou-se uma incrível redução de 60% da prevalência de doenças cardiovasculares (17).

Uma vez que as doenças cardiovasculares são a principal causa de morte na União Europeia (47%) e nos Estados Unidos (40%) (18) , faz todo o sentido adotar medidas que possam reduzir a sua prevalência, nomeadamente através da redução da ingestão de gorduras trans.

As gorduras trans não são todas iguais

Alimentos como a carne e lacticínios derivados de animais ruminantes também contém gorduras trans (ácido vaccénico e ácido linoleico conjugado (CLA)), mas estes têm uma composição química diferente da gordura trans artificial (ácido elaídico) e vários estudos sugerem que, ao contrário do que acontece com as gorduras trans artificiais, a sua ingestão não está associada a um agravamento da saúde cardiovascular, maior resistência à insulina, nem à inflamação sistémica (19-22).

A gordura interestereficada é uma alternativa viável?

A gordura interesterificada (ou óleo interesterificado) é outro tipo de gordura de origem industrial que foi hidrogenada e posteriormente sofreu outras modificações químicas.

Este tipo de gordura também está presente em muitos alimentos processados, principalmente margarinas e produtos de confeitaria, sendo que tem vindo a ser cada vez mais usado para substituir a gordura trans nesse tipo de produtos.

No entanto, a verdade é que, tal como acontece com as gorduras trans, a ingestão de gordura interesterificada também implica um aumento do risco de vários problemas de saúde, principalmente ao nível da saúde cardiovascular e do metabolismo da glicose.

Vários estudos demonstraram que a gordura interestificada pode (23-25):

  • Reduzir os níveis de colesterol HDL.
  • Aumentar os níveis de colesterol LDL.
  • Aumentar os níveis de glicose no sangue.
  • Reduzir os níveis de insulina no sangue.
  • Aumentar o risco de síndrome metabólica e predispor ao excesso de peso.

Conclusão

As gorduras trans artificiais (ácido elaídico), produzidas pela indústria alimentar têm um impacto negativo na saúde da população, principalmente ao nível da saúde cardiovascular e a sua substituição por gordura interesterificada também representa riscos para a saúde.

Por outro lado, as gorduras trans que se encontram naturalmente presentes no leite e carne de animais (ácido vaccénico e ácido linoleico conjugado) têm uma estrutura química diferente do ácido alídico e a sua ingestão não parece estar associada a problemas de saúde.

A redução da presença de ácido elaídico da dieta do ser humano afigura-se necessária e urgente, principalmente nos países que carecem de legislação que controle a utilização destas gorduras artificiais em alimentos processados, cadeias de restaurante e fast-food.

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  1. Kummerow FA. The negative effects of hydrogenated trans fats and what to do about them. Atherosclerosis. 2009; 205(2):458-65.
  2. Ganguly R, Pierce GN. The toxicity of dietary trans fats. Food and Chemical Toxicology. 2015; 78:170-76.
  3. Dhaka V, Gulia N, Ahlawat KS, Khatkar BS. Trans fats—sources, health risks and alternative approach - A review. Journal of food science and technology. 2011; 48(5):534-41.
  4. Gibson EL, Barr S, Jeanes YM. Habitual fat intake predicts memory function in younger women. Frontiers in Human Neuroscience. 2013; 7:838.
  5. Kiage JN, Merrill PD, Robinson CJ, Cao Y, Malik TA, Hundley BC, et al. Intake of trans fat and all-cause mortality in the Reasons for Geographical and Racial Differences in Stroke (REGARDS) cohort. The American Journal of Clinical Nutrition. 2013; 97(5):1121-28.
  6. Teegala SM, Willett WC, Mozaffarian D. Consumption and health effects of trans fatty acids: a review. Journal of AOAC International. 2009; 92(5):1250-7.
  7. Barnard ND, Bunner AE, Agarwal U. Saturated and trans fats and dementia: a systematic review. Neurobiology of aging. 2014; 35 Suppl 2:S65-73.
  8. Tsai CJ, Leitzmann MF, Willett WC, Giovannucci EL. Long-term intake of trans-fatty acids and risk of gallstone disease in men. Archives of internal medicine. 2005; 165(9):1011-5.
  9. Chavarro JE, Rich-Edwards JW, Rosner BA, Willett WC. Dietary fatty acid intakes and the risk of ovulatory infertility. Am J Clin Nutr. 2007; 85(1):231-7.
  10. Burris J, Rietkerk W, Woolf K. Relationships of self-reported dietary factors and perceived acne severity in a cohort of New York young adults. Journal of the Academy of Nutrition and Dietetics. 2014; 114(3):384-92.
  11. Brouwer IA, Wanders AJ, Katan MB. Trans fatty acids and cardiovascular health: research completed[quest] [Review]. Eur J Clin Nutr. 2013; 67(5):541-47.
  12. Mozaffarian D, Katan MB, Ascherio A, Stampfer MJ, Willett WC. Trans Fatty Acids and Cardiovascular Disease. New England Journal of Medicine. 2006; 354(15):1601-13.
  13. Remig V, Franklin B, Margolis S, Kostas G, Nece T, Street JC. Trans Fats in America: A Review of Their Use, Consumption, Health Implications, and Regulation. Journal of the American Dietetic Association. 2010; 110(4):585-92.
  14. Uauy R, Aro A, Clarke R, Ghafoorunissa, L'Abbe MR, Mozaffarian D, et al. WHO Scientific Update on trans fatty acids: summary and conclusions. Eur J Clin Nutr. 0000; 63(S2):S68-S75.
  15. The FDA takes step to remove artificial trans fats in processed foods. FDA News Release. 2015
  16. SM Downs AT, and SR Leeder. The effectiveness of policies for reducing dietary trans fat: a systematic review of the evidence. PubMed Health. 2013
  17. Leth T, Jensen HG, Mikkelsen AA, Bysted A. The effect of the regulation on trans fatty acid content in Danish food. Atherosclerosis Supplements. 2006; 7(2):53-6.
  18. 2012 European Cardiovascular Disease Statistics. European Society of Cardiology. 2012
  19. Bendsen NT, Christensen R, Bartels EM, Astrup A. Consumption of industrial and ruminant trans fatty acids and risk of coronary heart disease: a systematic review and meta-analysis of cohort studies. Eur J Clin Nutr. 2011; 65(7):773-83.
  20. Motard-Belanger A, Charest A, Grenier G, Paquin P, Chouinard Y, Lemieux S, et al. Study of the effect of trans fatty acids from ruminants on blood lipids and other risk factors for cardiovascular disease. Am J Clin Nutr. 2008; 87(3):593-9.
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  25. Misan V, Estato V, de Velasco PC, Spreafico FB, Magri T, dos Santos RMdAR, et al. Interesterified fat or palm oil as substitutes for partially hydrogenated fat during the perinatal period produces changes in the brain fatty acids profile and increases leukocyte–endothelial interactions in the cerebral microcirculation from the male offspring in adult life. Brain Research. 2015; 1616:123-33.

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