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Evite os Suplementos de Vitaminas e Antioxidantes

Os suplementos de vitaminas e antioxidantes são dos mais ingeridos em todo o mundo, sobretudo nos EUA, onde mais de um terço de população os ingere diariamente (1).

A população em geral, incluindo os praticantes de musculação e os atletas de vários desportos,  também são grandes adeptos da ingestão deste tipo de suplementos, seja porque foram influenciados pelo marketing da indústria dos suplementos, ou por indicação dos seus treinadores, amigos ou familiares.

Muitos dessas pessoas acreditam que a ingestão adicional de vitaminas e antioxidantes, pode promover uma melhoria da saúde, da longevidade e ainda uma melhoria do rendimento físico, sobretudo ao nível da recuperação.

Mas será que a ingestão de suplementos de vitaminas/antioxidantes pode realmente proporcionar esses benefícios? É essa a questão a que irei tentar responder ao longo deste artigo.

Os suplementos de vitamina/antioxidantes melhoram a saúde/longevidade?

Felizmente para todos nós, já foram realizados vários estudos que pretenderam avaliar a eficácia da ingestão de suplementos antioxidantes na saúde, mais precisamente no risco de mortalidade.

A maioria das pessoas associa de forma automática os suplementos antioxidantes a uma melhoria da saúde e talvez também a uma maior longevidade e qualidade de vida através da redução do risco de doenças como o cancro, doenças cardiovasculares e mortes por outras causas.

Isto poderia fazer sentido, uma vez que os antioxidantes oferecem proteção contra os radicais livres, que estão associados ao envelhecimento prematuro.

No entanto, os artigos de revisão realizados até hoje indicam que a ingestão de suplementos de vitaminas não tem qualquer efeito a esse nível, e caso existe algum efeito benéfico, este será muito ligeiro e não o suficiente para ter algum impacto ao nível do risco de mortalidade (2, 3, 4, 5).

Na verdade, existe literatura científica que sugere precisamente o contrário; A ingestão de suplementos de vitaminas/antioxidantes, sobretudo aqueles que incluem vitamina A, beta-caroteno e vitamina E, podem aumentar de forma significativa o risco de mortalidade (6, 7, 8).

Os autores de um estudo de revisão chegaram mesmo ao ponto de sugerir que os suplementos de antioxidantes deveriam passar a ser considerados fármacos e extensivamente testados antes de serem vendidos de forma livre (9).

As pessoas que poderão obter benefícios com a ingestão deste tipo de suplementos são aqueles que seguem um regime alimentar inadequado, que não fornece a quantidade mínima de nutrientes necessária para a manutenção da saúde.

É o que sugerem os autores de um artigo de revisão, no qual afirmam que o uso de suplementos de vitaminas/minerais não tem qualquer efeito ao nível da prevenção de doenças cardiovasculares, mas poderá prevenir o cancro e a degeneração macular, apenas em indivíduos com uma ingestão inadequada de vitaminas (10).

Neste contexto, a suplementação com vitamina D parece ser uma excepção, na medida em que parece ter realmente um efeito positivo ao nível da mortalidade, o que não será de surpreender se tivermos em conta que uma grande percentagem da população mundial é deficiente nesta vitamina (11, 12, 13).

O caso da vitamina C

A vitamina C é uma das mais conhecidas e, por várias razões, muitas pessoas têm o hábito de ingerir quantidades elevadas desta vitamina em forma de suplementos.

Um dos principais motivos que leva as pessoas a suplementar-se com vitamina C está relacionado com os seus supostos efeitos fortalecedores do sistema imunológico. No entanto, já ficou comprovado que esta também não reduz de forma significativa o risco de constipação (14).

No que diz respeito a outros aspetos da saúde,  embora a manutenção de níveis adequados de vitamina C seja importante para prevenir o declínio cognitivo derivado do envelhecimento, a ingestão de quantidades elevadas de vitamina C não parece oferecer proteção extra nesse sentido (15).

Os suplementos de vitamina C reduzem os níveis de cortisol?

Um dos maiores mitos que envolve a ingestão de vitamina C e que leva muitos praticantes de musculação a ingerirem doses muito elevadas desta vitamina, é o seu suposto poder redutor dos níveis de cortisol, sobretudo quando ingerida em doses elevadas.

No entanto, foram realizados muito poucos estudos acerca deste tema, e a redução dos níveis de cortisol só ficou comprovada em circunstâncias muito específicas e, mais precisamente, apenas em atletas de resistência.

Um desses estudos verificou uma redução dos níveis de cortisol em atletas que ingeriram 1500 mg de vitamina C, 7 dias antes, no próprio dia, 24 horas e 48 horas após uma ultra-maratona, na qual os atletas correram 90 km.

No entanto, a diminuição dos níveis de cortisol apenas foi significativa (-34,7%) durante um curto espaço de tempo muito curto; imediatamente após o final da corrida.

Durante os sete dias que antecederam a corrida, 24 horas e 48 horas após a ultramaratona, não existiram diferenças estatisticamente significativas nos níveis de cortisol entre os grupos que ingeriram vitamina c e aqueles que ingeriram um placebo (16). Um outro estudo, com um design bastante similar, obteve resultados praticamente idênticos.

Como é óbvio, não é possível extrapolar estes resultados, obtidos com uma população muito específica (ultra-maratonistas) e em condições extremas, para os praticantes de musculação e muito menos para a população em geral.

Aliás, em outras condições e noutros tipos de população, tal como em indivíduos que sofrem de doenças imunes/alergia, a suplementação com vitamina C pode aumentar a produção de cortisol e ainda potenciar a atividade do cortisol endógeno (18).

A suplementação com vitamina C promove a hipertrofia muscular?

Agora vamos ao que realmente interessa à maioria dos leitores deste blog. Independentemente dos seus efeitos ao nível do cortisol, será que a suplementação com esta vitamina promove uma maior hipertrofia muscular?

É muito provável que não. Um estudo realizado em 2013 verificou que a suplementação com vitamina C inibe, pelo menos em parte, a hipertrofia muscular que normalmente teria lugar após um treino com pesos (19).

Para além disso, verificou-se ainda que a suplementação com ácido ascórbico (vitamina C) provoca um atraso significativo da recuperação muscular e uma diminuição da capacidade física (20).

Isto poderá constituir um choque para aqueles que todos os meses gastam dinheiro na aquisição desta vitamina com a esperança de virem a ter resultados mais rápidos.

Os suplementos de vitaminas/antioxidantes melhoram o rendimento/recuperação?

Pode ser tentador acreditar a ingestão de doses elevadas de antioxidantes em forma de suplementos poderá melhorar o rendimento desportivo e/ou a recuperação dos treinos, mas as evidências científicas mais recentes parecem sugerir exatamente o contrário.

Por exemplo, um estudo publicado em 2009, no qual se administrou 400 mg de vitamina E e 1 grama de vitamina C, verificou que a suplementação com antioxidantes inibe uma parte significativa dos efeitos benéficos que o exercício físico proporciona.

Para ser mais preciso, os investigadores verificaram a suplementação com antioxidantes inibe a melhoria da sensibilidade à insulina e da capacidade do mecanismo de defesa antioxidante do próprio organismo (21).

Isso acontece porque a ingestão de doses elevadas de antioxidantes parece limitar ou inibir o efeito da adaptação natural do corpo aos treinos. Para além disso, também têm o potencial de gerar efeitos pro-oxidativos (22).

Embora os radicais livres estejam associados a efeitos negativos na saúde humana, também são essenciais para o desenvolvimento e funcionamento adequado de todas as células, e também para que ocorram adaptações em resposta aos treinos (23).

Existem riscos?

Anteriormente já vimos que a suplementação com vitaminas e antioxidantes poderão não ser isenta de riscos.

Vitamina A: A ingestão excessiva de vitamina A (retinol) está associada a um maior risco de osteoporose, a lesões ósseas e à inibição da síntese proteica, pode ainda provocar cirrose e aumentar o risco de mortalidade (24, 25, 26, 27, 28).

Vitamina C: A suplementação com esta vitamina C, especialmente com doses elevadas, pode aumentar para o dobro o risco de vir a sofrer de pedras nos rins (29, 30, 31).

Vitamina D: Apesar de várias instituições de saúde oficiais como a American Academy of Pediatrics recomendarem a ingestão de suplementos de vitamina D, a ingestão de doses extremamente elevadas desta vitamina (acima de 10.000 UI/dia) também pode provocar problemas sérios de saúde, tais como anorexia, arritmias cardíacas, perda de peso, poliúria.

Pode ainda aumentar os níveis sanguíneos de cálcio, conduzindo assim à calcificação dos vasos sanguíneos e de outros tecidos, provocando assim danos no sistema cardiovascular e rins. (32)

Vitamina E: O excesso da sua ingestão aumenta de forma significativa o risco de cancro da próstata em indivíduos saudáveis , o risco de sofrer hemorragias   e ainda o risco de mortalidade (33, 34, 35, 36, 37, 38, 39).

Vitaminas do grupo B: A ingestão de doses elevadas de vitaminas do grupo B é considerada um fator de risco para a obesidade e para a diabetes (40, 41).

Vitamina B6: Quando ingerida em excesso durante períodos prolongados de tempo, poderá provocar danos nos nervos sensitivos,perda do controlo dos movimentos corporais, cansaço, dificuldades em caminhar, problemas cutâneos, náuseas e outros (42, 43, 44, 45).

Conclusão

É verdade que a avitaminose ou a ingestão insuficiente de vitaminas pode ter consequências graves para a saúde do ser humano, mas também é verdade que a ingestão excessiva também apresenta riscos.

  • A literatura científica que confirma a segurança e a eficácia dos suplementos de vitaminas e antioxidantes para melhoria da saúde e para prolongar a vida é extremamente limitada (46).
  • Verificou-se que a ingestão excessiva de vitaminas e antioxidantes poderá prejudicar a sua saúde em vez de a melhorar, aumentando até o seu risco de mortalidade.
  • Os suplementos de vitaminas /antioxidantes, incluindo aqueles que contêm vitaminas do complexo B, vitamina C ou E, não melhoram o desempenho físico, a composição corporal nem a saúde em indivíduos saudáveis, que seguem uma dieta equilibrada e que não sofrem de carências nutricionais (47, 48).
  • A melhor forma de obter os níveis adequados de vitaminas e antioxidantes continua a ser através de uma dieta bem formulada, que seja equilibrada e variada, que forneça os níveis adequados, sem a necessidade de suplementação adicional.
  • Caso suspeite de que sofre de algum tipo de carência de vitaminas, deverá consultar um médico ou um nutricionista, que lhe irá prescrever análises e, caso seja necessário, irá modificar a sua alimentação e/ou prescrever algum suplemento ou medicamento que possa ser necessário para corrigir a sua avitaminose.

A verdade é que grande maioria das pessoas não faz ideia se sofre ou não de algum tipo de deficiência nutricional e acabam por ingerir uma grande variedade de suplementos que muito provavelmente não necessitam.

No entanto, mais nem sempre é melhor e este parece ser um desses casos em que poderá ser melhor agir de forma cautelosa.

Apesar do seu consumo estar banalizado, não seja comece a tomar suplementos de vitaminas apenas porque leu ou ouviu dizer que são essenciais para a saúde e/ou para melhorar a composição corporal.

Em vez disso, dê mais valor à sua saúde (e também ao seu dinheiro), começando por realizar uma pesquisa prévia, de forma a poder ficar mais informado acerca da vitamina ou vitaminas que lhe despertaram o interesse e que pensa ingerir em forma de suplementos.

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