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A Refeição Pós-Treino Promove a Hipertrofia Muscular?

Durante os últimos anos foram publicados artigos que afirmam ou defendem que a típica refeição que muitos ingerem no final dos seus treinos de musculação não é importante, e que não promove um maior anabolismo.

Em suma, o que esses autores afirmam é que afinal, a famosa “janela de oportunidade” não existe, que a ingestão de uma proteína de absorção rápida (normalmente proteína whey) e de carboidratos de alto índice glicémico não proporciona benefícios adicionais e que o horário em que realizamos as refeições não é assim tão importante.

Esses autores costumam basear-se em estudos como estes dois (1, 2) nos quais os investigadores não encontraram diferenças entre a ingestão de uma refeição com proteína whey logo após i final dos treinos e uma refeição realizada horas mais tarde.

No caso do estudo que indicamos acima, realizado por Hoffman et al. (1) este foi limitado pelo uso do método DXA para determinar a composição corporal, pois esse método tem o problema de ter sensibilidade suficiente para detetar pequenas mudanças na massa muscular em comparação com outros métodos como o MRI e CT (3).

De qualquer forma, esses autores esquecem-se de referir a existência de um número significativo de estudos que encontraram resultados positivos com a ingestão de proteína e hidratos de carbono de absorção rápida logo a seguir ao treino.

Dito isto, neste artigo irei referir aqueles estudos que observaram resultados positivos com esta abordagem alimentar.

A refeição pós-treino é importante?

Um estudo realizado 2001 em investigou o efeito que a ingestão de uma refeição com proteína imediatamente a seguir ao treino ou 2 horas depois, tinha na hipertrofia muscular e nível de força ao longo de um período de 12 semanas.

Aqueles indivíduos que ingeriram a bebida imediatamente a seguir ao treino, que continha 10 gramas de proteína, 7 gramas de carboidratos e 3 gramas de gordura, ganharam força e massa muscular, enquanto o grupo que ingeriu a refeição 2 horas mais tarde apenas aumentaram a sua força dinâmica em 36%.

Esses resultados indicam que a realização de uma refeição após um treino é um fator importante para o aumento da massa muscular (4).

Num outro estudo, Levenhagen et al, os investigadores administraram um suplemento de proteína (10 gramas de proteína, 8 gramas de hidratos de carbono, 3 gramas de gordura) imediatamente a seguir, ou três horas depois de um treino com pesos.

Os resultados indicam que o balanço de aminoácidos foi significativamente mais positivo com a refeição pós-treino, em comparação com a refeição realizada 3 horas mais tarde. De fato, houve um balanço positivo de absorção de aminoácidos com a refeição pós-treino, enquanto houve um balanço negativo (perda de aminoácidos) quando a refeição foi realizada 3 horas mais tarde.

Para além disso, a síntese de proteína na perna foi três vezes mais elevada com a refeição pós-treino do que com a refeição realizada mais tarde. Finamente, a deposição de proteína no corpo inteiro também foi mais elevada com a refeição pós-treino do que com a refeição realizada 3 horas depois (5).

Sabe-se também que a síntese de proteína é estimulada em resposta ao treino com pesos e numa investigação, realizada por Philips et al. , verificou-se que esses efeitos estão inversamente relacionados com o tempo (6).

Ou seja, quanto mais tempo esperar até realizar a sua refeição pós-treino, mais reduzida irá ser a formação de tecido muscular.

Efeito anti-catabólico

Outro benefício da refeição pós-treino é a atenuação da degradação de proteína muscular. Isso acontece principalmente devido ao aumento dos níveis de insulina, juntamente com o aumento da disponibilidade de aminoácidos (6. 7).

Vários estudos demonstraram que o nível de degradação muscular torna-se mais elevado num período curto depois do exercício e que rapidamente decai a seguir (7).

Mas quando em jejum, a degradação de proteína muscular é significativamente elevada aos 195 minutos após um treino, o que resulta num equilíbrio negativo de proteína (8).

Esses valores podem aumentar até mais 50% após 3 horas, e a proteólise pode persistir durante mais de 24 horas após o período pós-treino (7).

Embora se saiba que a insulina possui propriedades anabólicas (8, 9), acredita-se que esta hormona atua sobretudo como anti-catabólico no pós-treino (10, 11).

Glicogénio

Já foi comprovado que os treinos típicos de musculação, com um volume moderado (6-9 séries por grupo muscular) podem reduzir as reservas de glicogénio em 36-39% (12, 13). E certos atletas, como os fisiculturistas de competição, realizam treinos com um volume ainda mais elevado.

Também foi demonstrado que a disponibilidade de glicogénio influencia a degradação de proteína muscular Lemon and Mullin [19] descobriram que as perdas de nitrogénio mais que duplicam após uma sessão de treino com as reservas de glicogénio esgotadas versus reservas de glicogénio cheias (14).

Outras investigações demonstraram uma relação inversa similar entre os níveis de glicogénio e a proteólise (degradação de proteína muscular) (15, 16). Tendo em conta estes dados, podemos supor que a manutenção de níveis intramusculares elevados de glicogénio no início do treino e o restabelecimento rápido das reservas de glicogénio, poderá ser benéfico para os praticantes de musculação e de outros desportos.

Na verdade, vários estudos mostram uma supercompensação das reservas de glicogénio quando se ingere carboidratos imediatamente após o final do treino, e atrasar o seu consumo por apenas 2 horas, atenua o rácio de ressíntese de glicogénio muscular em até 50% (17).

Também existem evidências de que a adição de proteína a uma refeição pós treino à base de carboidratos pode promover ainda mais a ressíntese de glicogénio. Berardi et al. demonstrou que a adição de proteína a uma refeição pós-treino com carboidratos no período de 2 horas a seguir a uma sessão de ciclismo de 60 minutos, resultou numa ressíntese de glicogénio significativamente maior em comparação com a ingestão de apenas carboidratos (18).

Outra investigação, realizada por Similarly, Ivy et al.  obteve resultados semelhantes (19). Pensa-se que os efeitos sinergísticos da combinação proteína-hidratos de carbono devem-se a uma resposta mais pronunciada da insulina (20).

O leite como bebida pós-treino

Num estudo realizado na Universidade McMaster, Philips et al. colocou um grupo de voluntários a ingerir 1 de três bebidas imediatamente antes, e uma hora após uma sessão de treino (21).

As bebidas continham 500 ml de leite (18.2 gramas de proteína), uma mistura de proteína de soja ou uma bebida com maltodextrina. Sendo que todas as bebidas continham o mesmo número de calorias.

Após 12 semanas de treinos com pesos, os investigadores verificaram que o grupo que ingeriu o leite ganhou uma quantidade maior de massa muscular magra do que os outros dois grupos, enquanto não houve diferenças entre o grupo que ingeriu soja e o que ingeriu maltodextrina.

Este estudo também demonstra a importância de realizar uma refeição pós-treino com proteína de alta qualidade, ou seja, de origem animal.

Conclusão

Talvez o maior benefício da refeição pós-treino seja o possível aumento da síntese de proteína muscular. Já foi demonstrado que o treino com pesos, por si só, promove um aumento de duas vezes na síntese de proteínas após o exercício, aumento esse que é contrabalançado por um aumento da proteólise (22).

Parece que os efeitos estimuladores da hiperaminoacidemia sobre a síntese de proteína muscular, especialmente a partir de aminoácidos essenciais, são potenciados pelo exercício anterior (23, 24). Há alguma evidência de que os hidratos de carbono têm um efeito aditivo no aumento da síntese de proteína muscular nos pós-treino quando combinada com a ingestão de aminoácidos (25).

No que diz respeito à síntese de proteína, já foram realizados muitos estudos que investigaram a existência de uma possível janela anabólica no período pós-treino. As evidências sugerem que para maximizar a síntese de proteína muscular, a ingestão de aminoácidos e/ou proteína com ou sem hidratos de carbono, é superior à ingestão de apenas hidratos de carbono ou um placebo sem calorias (26, 27, 28, 29).

Na opinião do autor deste artigo e de acordo com vários estudos, as refeições pré e pós-treino podem proporcionar os seguintes benefícios:

  • Menos catabolismo e mais anabolismo: A refeição pós-treino parece promover um ambiente anabólico que por sua vez pode facilitar o acúmulo de maiores quantidades de massa muscular.
  • Maior ingestão de proteína: Já sabemos que os praticantes de musculação necessitam de ingerir uma quantidade de proteína superior à recomendada para os indivíduos sedentários e portanto, o aumento da ingestão de proteína derivado da inclusão das refeições pré e pós-treino, pode promover maiores ganhos de força e de massa muscular.
  • Recuperação muscular mais rápida: A ingestão de uma dose de carboidratos antes e depois dos treinos, permite minimizar o catabolismo. Isso acontece em parte devido ao fato dos carboidratos elevarem os níveis de insulina, que possui um efeito anticatabólico. E também permite um restabelecimento mais rápido das reservas de glicogénio.

Ganhar força e massa muscular é uma das coisas mais difíceis de conseguir, especialmente depois dos primeiros meses de treino, por isso, convém ajustar a dieta e o horário das refeições de forma a acelerar a recuperação e estimular a hipertrofia muscular, para assim maximizar os seus resultados no ginásio.

Na minha opinião, se está realmente focado em ganhar mais massa muscular, então deveria utilizar todos os recursos “naturais” que estiverem ao seu alcance, e definitivamente deveria realizar as refeições pré e pós-treino, ingerindo carboidratos e proteína de absorção rápida antes e logo após o final dos seus treinos com pesos.

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